quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Mark

"Meia hora depois, quando saiu do restaurante e se despediu do amigo, o clarão de um pôr-do-sol avermelhado inundava a vista do canal, enquanto mais ao longe, em meio à chuva que caía obliquamente, uma estreita tira de ouro marginava a ponte por onde desfilavam pequenas silhuetas negras.
[...] Sua felicidade e a limpidez do ar deixavam-no algo tonto. Uma seta reluzente de cobre atingiu o sapato envernizado do elegante cavalheiro que descia de uma carro. As poças que ainda não haviam acabado de secar, circundadas pela contusão arroxeada da umidade (os olhos vivos do asfalto), refletiam a suave incandescência do final de tarde. As casas continuavam cinzas como sempre; no entanto, os telhados, as cornijas acima dos últimos andares, os para-raios pintados de dourado, as cúpulas de pedra, as colunatas - que ninguém nota durante o dia, pois os passantes então raramente erguem os olhos - estavam agora banhados de um ocre suntuoso, o sopro cálido do poente, e por isso aquelas varandas, aqueles pilares e frisos, pareciam tão surpreendentes e mágicos, contrastando fortemente, por seu brilho fulvo, com as insípidas fachadas que ficavam abaixo".